O Mágico de Oz

O Mágico de Oz
De Victor Fleming
DVD, sex 25 março 21hs
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Posso lhes contar um segredo? Espero que meus milhares de ávidos leitores não riam de mim, mas nesse sábado vi pela primeira vez um filme que há muito tempo estava na minha lista de obrigatórios: O Mágico de Oz. Sim, e o filme é de fato impressionante porque é uma espécie de síntese do bom e velho cinema americano: um cinema a favor do espetáculo, de grande domínio técnico, e acima de tudo um cinema moral. As seqüências em que Dorothy chega ao mundo dos Duendes, e quando chega ao castelo de Oz, são recheadas de números musicais mágicos, com uma cenografia, jogo de câmera e combinação de cores irresistíveis, integrando qualquer antologia do cinema clássico americano. É uma espécie de jogo surrealista: o pó avermelhado quando surge e desaparece a Bruxa do Oeste, a bola de cristal, as sobreimpressões dentro do tornado são típicas de um filme de Meliès, só que aliadas a um cinema eminentemente narrativo. Claro, vale lembrar que no final, Dorothy fica com a impressão de que tudo foi um sonho (as semelhanças dos seus amigos de Oz com seus amigos em Kansas, etc.). Ou seja, O Mágico de Oz é um filme surrealista.

Por outro lado, o filme tem um desenvolvimento narrativo bastante simples, e no fundo soa conservador, como o típico filme americano: a volta de Dorothy é necessária, a América dá o conforto e as respostas para a angústia de seus personagens, que enfrentam os desafios e saem vencedores.

Mas o que ficou um mim de verdade nesse O Mágico de Oz é a travessia moral de Dorothy: todo o filme é uma reflexão – apesar de simples e não complexa como por exemplo a travessia de The Last Sunset – de qual é o sentido de um lar. “There´s nothing like home. There´s nothing like home.” – as palavras de Dorothy ecoam em nossos ouvidos. Os quatro personagens – Dorothy, o leão, o homem de lata e o espantalho – no fundo buscam algo que já têm, mas que eles não se apercebem. Cada um já guarda consigo suas próprias virtudes, basta acreditar em si. Esse é o cinema moral americano em seu estado mais puro, mais límpido. O lar de Dorothy é a América rural, edílica, ainda que com um certo ar de decadentismo e romantismo. O mundo rural parece um quadro de Constable ou de Gainsborough, mas tem o seu charme.

Qual é o sentido de um lar? Apesar de preto-e-branco, limitado, cheio de injustiças, a pequena casa de Kansas é onde Dorothy se sente em casa. Por quê? Seria por sua Tia Em, por seus amigos desastrados, pela caminhada sobre uma cerca, pela presença de seu amado cachorrinho? O filme não dá respostas. Mas apesar de todo o clima onírico, de toda a beleza colorida do mundo do faz-de-contas, há um estranhamento, um não-estar lá. Ao mesmo tempo, o lar de Dorothy é acolhedor mas tem um quê de sombrio. Essa dualidade é que torna o simplório O Mágico de Oz um filme inesquecível, um uso do mise-en-scene muito preciso, muito ambíguo, muito doloroso (o filme foi feito no entreguerras). Me despertou muitas, muitas idéias sobre esse tema do “lar”, que é um tema muito precioso para mim.

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