Dupla de dois

Antes do Amanhecer
de Richard Linklater
DVD dom 2 16:30
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Antes do pôr-do-sol
de Richard Linklater
DVD dom 3 18:30
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Meu compromisso romântico do final de semana foi ver a dupla de filmes com Ethan Hawke e Julie Delpy no DVD Já tinha ouvido falar bem dos filmes mas não esperava grande coisa.Antes do Amanhecer é uma mistura entre Desencanto e Tarde Demais para Esquecer com um recheio pop típico dos anos noventa. A casualidade do encontro, a possibilidade de “mudar uma vida por um grande amor”, a despedida na estação de trem, tudo evoca um certo clima de romantismo típico do cinema embalado pelas ruelas de Viena. Os jovens têm o “frescor da juventude”, embora Ethan Hawke esteja péssimo no papel.O problema é que a encenação é muito modesta, simplesmente ilustrando o roteiro de bons sentimentos: entre o casal há um conjunto de estereótipos que nunca fazem o filme tornar-se humano: estereótipo entre a França e os Estados Unidos, entre o homem (prático) e a mulher (romântica), entre a ilusão e a realidade, coisas desse tipo. Dois breves instantes de cinema: um quando o casal ouve música numa cabine (uma troca muda de olhares) e outro (esse sim especial) quando, após a despedida, a câmera observa, em plano fixo, os lugares de Viena por que os amantes percorreram, mas desta vez vazios. Os atores estão soltos mas não conseguem salvar o filme: descritivo no mau sentido, repetitivo, “velho”, Antes do Amanhecer pelo menos não carrega nas tintas do drama, mas não é o suficiente para ser um trabalho de cinema

Já o elogiado Antes do pôr-do-sol é ruim mesmo, bem pior que o primeiro. Em primeiro lugar, o filme é só roteiro, extremamente verborrágico, e cinematograficamente muito pobre. É o casal acompanhado por uma steadicam andando ombro a ombro pelas ruas de Paris. Quando há a necessidade de um corte (seja por uma falha, seja por acabar o rolo), corta-se para um steadicam pelas costas do casal, para então voltar para a posição frontal e continuar o filme. Os diálogos são absolutamente gastos, sem vida, fúteis e sem nenhuma importância. Daí rapidamente descobrimos a diferença de um Manoel de Oliveira, de um Eric Rohmer, (ou até de um Woody Allen) para este filme de Linklater: embora os primeiros cineastas façam filmes descritivos, verborrágicos, pára-literários, são absolutamente cinematográficos, seja pelo rigor da encenação (Oliveira), seja pelo frescor das dissimulações e dos jogos verbais que incitam uma metalinguagem (Rohmer) seja pelas incontáveis referências a si mesmo e pelo humor auto-referente e refinado (Allen). Mas nesse filme de Linklater parece que estamos no início do cinema falado: tudo se resolve pelo diálogo, e tudo o mais parece insignificante, a não ser um passeio quase turístico por alguns pontos de Paris. A imagem banal, o texto banal, os personagens banais: é o cinema burguês em sua pior expressão, patética, dissimulada, mesquinha. Em segundo lugar, o filme tem um tom bastante diferente do primeiro, como se os personagens tivessem uma intensa intimidade após nove anos sem se verem. A velocidade do texto, as referências a um humor às vezes apelativo, quase fazem de Antes do pôr-do-sol uma sitcom americana passada ao ar livre em Paris. Julie Delpy gesticula e fala num tom de voz que descaracteriza por completo sua personagem, e todo o filme se prende a tiques, manias, esquetes verbais e demais recursos completamente superficiais e desnecessários. Um único instante de cinema acontece num final sugestivo, em aberto, em que Ethan Hawke, sentado numa poltrona, alisa o anel de casado em sua mão esquerda de forma sutil e comenta que “certamente deve perder o avião”. Muito pouco para um filme que ilustra tudo o que eu não acredito seja em termos de cinema seja em termos de relacionamento homem-mulher.

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