(FESTRIO 1) Síndromes e um Século

Síndromes e um Século

De Apichatpong Weerasetakhul

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Apichatpong é como Glauber: seus filmes estão longe de serem chatos, chatos são os membros do seu fã-clube. Com isso, acabamos ficando com uma certa implicância com toda essa unanimidade em torno do seu cinema. Mas visto com uma certa distância, não há como não dizer que Síndromes e um Século é um filme adorável, admirável. Ora, isso porque é um trabalho de enorme liberdade formal, e ficamos impressionados em como Apichatpong consegue isso através de um “cinema leve”, profundamente antenado com as possibilidades imagéticas/narrativas mas ao mesmo tempo sem querer ceder aos cacoetes do cinema autoral. Então que cada plano, cada seqüência nos revela uma surpresa, e, por trás desse “cinema descosturado” podemos vislumbrar uma incrível unidade, uma incrível poesia, uma beleza que perpassa seus misteriosos filmes. Filmes cuja unidade não é possível encontrar, ou pelo menos não é possível segundo as regras (do cinema clássico, do cinema de autor) que estamos acostumados. Daí que o crítico se desconcerta ao falar de Apichatpong, e só lhe (nos) resta ficar fazendo essas observações patéticas e perdidas (o que só nos lembra o quanto é vão o exercício da crítica cinematográfica).

 

Síndromes e um Século é um filme de duas partes, passada a primeira em um hospital do campo e a segunda, num grande hospital de um centro urbano. As situações meio que se repetem mas com variações importantes. Dessa forma, ficamos pensando nos exercícios formalistas meio pós-modernos, desde Feitiço do Tempo até os filmes recentes de Hong Sang-Soo. Mas não se trata disso: ao contrário, não é da proposta de Apichatpong criar uma estrutura dupla para fazer jogos de espelho entre as narrativas (minha piada é que esse tipo de filme é como um jogo-dos-sete erros...). É mais uma pista falsa, dentro de todas as outras de seus filmes. Ou ainda, “pista falsa” somente porque nos acostumamos a buscar pistas nos filmes, quando no fundo eles são sobre situações e sobre a vida das pessoas.

 

O que nos resta são momentos. Mas não só eles. A habilidade de Apichatpong em criar uma atmosfera em Síndromes e um Século é em conferir ao filme esse olhar “aparentemente descuidado” mas misterioso, em que cada imagem revela e esconde (revela escondendo e esconde revelando). Bom, é isso o que consigo falar sobre o filme (um eclipse, uma aeróbica, uma orquídea, um tubo de gás, essas coisas...)

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