tentando tirar o atraso...

 

Mais filmes pendentes

 

O Bravo Guerreiro, de Gustavo Dahl ****

Curtas Edgard Navarro, em especial SuperOutro ***

A Pedra do Reino, de Luiz Fernando Carvalho ***

Desesperato, de Sérgio Bernardes * ½

 

 

Uma rápida observação:

O cinema brasileiro está numa fase MUITO digna de nota. Estamos em um momento em que um conjunto fantástico de filmes vem ficando prontos juntos. Todos são documentários: Serras da Desordem, Acidente, Santiago, e possivelmente (pois não os vi) O Andarilho, Jogo de Cena. Cinco obras-primas.

 

No entanto, em todos o registro documental se cruza com um olhar ficcional, seja no sentido de uma metalinguagem, de uma recriação, ou da imbricação com um olhar plástico ou “experimental”. O que nos remete ao fato de que o melhor cinema “ficcional” da atualidade tem seu diálogo íntimo com o documental (é claro que falo de Zhang-Ke e não de Ken Loach!). Isso sem falar de Wang Bing, que estou conhecendo agora.

 

Um outro tópico:

Preciso desenvolver mais isso, mas com uma adequada revisão no MAM, fica claro que O BRAVO GUERREIRO é o filme definitivo sobre os conflitos entre o Cinema Novo e os grupos de poder, ou ainda, é um filme definitivo sobre os rumos do cinema brasileiro e do país. Ainda, é um filme profético em relação aos futuros rumos do cinema brasileiro enquanto instituição política, ainda mais se tivermos em mente os rumos de seu diretor. Mais do que isso, é um filme extremamente atual sobre o momento que vivemos HOJE, AGORA, no Brasil e no cinema brasileiro.

 

Além desse teor, suas qualidades estéticas são indiscutíveis: seu rigor straubiano, a elegância de sua mise-en-scene e seu extraordinário final-síntese mostram a grandeza e a importância de sua realização.

 

Desde já, um dos mais importantes filmes do cinema brasileiro que precisa urgentemente de uma revisão.

 

Mais um outro:

Não é possível que um trabalho como A Pedra do Reino passe despercebido. Só no Brasil. A seriedade e o empenho do trabalho de LFC; o preciosismo de sua adaptação rigorosa e ao mesmo tempo pessoal do árduo livro de Suassuna; seu desejo em unir um universo mitopoético com uma referência político-social de um país; um desejo incontido de um cinema de alegoria e de transgressão de certas convenções (lembrando o cinema de Glauber e Paradjanov) são muito, mas muito evidentes para serem neglicenciados, como infelizmente se está sendo.

 

Outro mais:

Vendo os curtas de Navarro, fica coerente o caminho que o levou ao seu primeiro longa-metragem, o bem-sucedido Eu Me Lembro, mas que, por outro lado, representa um certo amaciamento do teor radical e anárquico de sua filmografia. O diálogo com o cinema superoitista estava ficando para trás nos seus últimos curtas; uma certa “parábola de conotações morais” se encontrava em um deles, em 35mm, e as referências ao cinema de Fellini estão todas lá em SuperOutro. Este é um típico filme dos anos oitenta. Sendo assim, apesar de ter envelhecido, ao mesmo tempo nos lembra que nos anos oitenta, o cinema brasileiro foi pouco, assim como o cinema em geral também foi pouco. Emblemático dessa geração que não busca mais o “sonho impossível” mas simplesmente quer ter a liberdade de ser, SuperOutro é muito representativo, intenso mesmo, e nesse sentido é muito mais interessante que um O Cheiro do Ralo, por exemplo, com seu jeito blasé e sua pose de cinema independente. Nisso, Navarro nos traz muitas lições, mas ao mesmo tempo comprova que as forças e fraquezas de Eu Me Lembro estavam sendo cunhadas num processo de cinema que veio dos curtas em superoito até o esboço de longa narrativo de SuperOutro.

 

Sobre Em Busca da Vida:

O cinema clássico narrativo já está muito desgastado em relação às transformações da vida contemporânea. Como um cinema sério pode contribuir em relação a isso? Vivendo com os personagens, e não vivendo deles. Ou ainda, que o autor seja uma testemunha e não um deus. Ou ainda, que o espectador possa sentir a brisa que toca o rosto dos personagens ao invés de acompanhar suas ações. Que o discurso coletivo não brote de “personagens representativos” mas que tenha uma vida própria a partir dos rumos das coisas.

 

Essa é a contribuição de jia Zhang-Ke. Ele tem a difícil tarefa de abarcar as transformações contemporâneas da China, mas seu cinema não quer fazer isso: nem quer fazer a denúncia oportunista de um Zhang Yimou nem quer fazer o panfleto didático de um Ken Loach. Ele quer quer as pessoas possam conviver com esses personagens de uma forma mais humana, menos dogmática, menos “tosca”.

 

Em Busca da Vida avança menos nesse sentido do que os filmes anteriores do diretor chinês. Nesse sentido, é o seu trabalho mais palatável. Ainda assim, deve ser aplaudido de pé o primeiro filme do diretor a ser lançado comercialmente no Brasil (isso porque ganhou o principal prêmio de Veneza), porque seu cinema está entre o que de melhor se está fazendo e pensando em termos de linguagem cinematográfica hoje no mundo.

 

Depois tento falar mais. A vida como sempre corre mais rápido do que gostaríamos.

 

Comentários

Cine Caolho disse…
Oi Ikeda,
estamos com um blog: cahiersduceara.blogspot.com
colocamos um link do cinecasulofilia por lá.
contamos com a tua coolaboração!
abraço,
Guto

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