The Scarlet Letter

A letra escarlate

de Victor Sjostrom

***

 

Filme do sueco Victor Sjostrom em sua fase americana (quando ele assinava como "Seastrom"). Um drama intimista, uma crônica moral com vários paralelos com seus filmes da fase sueca, com a difrença do tom melodramático das convenções do cinema americano de gênero. Ainda assim, o filme possui um notável trabalho de mise-en-scene e uma total consciência do diretor do trabalho com os elementos de linguagem. Prova disso é o deslumbrante início, com uma câmera que passeia pela praça da cidadezinha com grande desenvoltura. O filme é extremamente coeso, apesar de alguns saltos estranhos na narrativa que quebram o seu desenvolvimento. Seu enredo é extremamente interessante: em um vilarejo com costumes bastante conservadores devido à religião protestante, uma mulher “independente” (Lilian Gish) provoca a fúria dos habitantes locais por não seguir à risca as convenções locais, e acaba se envolvendo com o pastor, considerado a maior referência “moral” do vilarejo. Lendo assim, podemos achar que a personagem de Gish é uma “femme fatale” mas é ao contrário: é símbolo de pureza e verdadeiro amor, que é combatido pelos “faristeus” do local. O pastor se apaixona por Gish ao ter contato com sua inocência, e é fabulosa a cena quando Gish esconde do pastor uma peça íntima após tê-la lavado em um riacho e ele acha que ele está escondendo dele algo importante. Nos filmes de Sjostrom em geral, e neste não é diferente, a natureza fala muito, e a cena do riacho é a oportunidade de Sjostrom de fazer com que os instintos naturais de seus protagonistas falem mais do que suas máscaras das convenções da sociedade. A performance de Gish é fantástica, e percebemos facilmente como ela foi uma das maiores do cinema mudo: ainda que presa a algumas convenções estilizadas do cinema silencioso, ela consegue um equilíbrio de fragilidade e força interior, ingenuidade e sensualidade muito convincentes, tornando sua personagem ligeiramente ambígua, na medida do possível. A sensualidade é outro elemento presente no filme, com o toque sutil mas preciso de Sjostrom: esses personagens serão condenados pelos faristeus porque amam demais, e essa sociedade precisará reprimir o amor, porque ele é muito subversivo. Sjostrom apresenta o dilema moral desse pastor: assumir seu filho ilegítimo com Gish (o fruto de seu verdadeiro amor) ou seguir no comando religioso dos faristeus. À medida que a narrativa caminha para seu desfecho no terceiro ato, o filme perde um pouco o seu interesse, mas nada que abale a elegância da mise-en-scene de Sjostrom, a segurança de sua direção e o tom crítico do filme às convenções conservadores de uma certa sociedade que condena a liberdade de ser e o amor. Belo filme.

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