O Mistério do Samba

O Mistério do Samba
de Carolina Jabor e Lula Buarque de Hollanda
* ½

A amiga Cris Arruda fez uma observação que resume à perfeição o que é o filme: ele poderia se chamar “Tudo Azul” ao invés de “O Mistério do Samba”. Essa observação nos traz um conjunto de questões: i) o fato de o filme se concentrar na Velha Guarda da Portela, ao invés de buscar uma abrangência maior sobre o universo do samba; ii) como o filme não possui nenhuma vinculação com a obra de referência do Hermano Vianna (no sentido da investigação) para, ao invés disso, buscar uma “leve crônica musical” de um grupo de pessoas; mas essencialmente aponta para o fato de o filme parecer uma espécie de material promocional do CD produzido por Marisa Monte com gravações da Velha Guarda da Portela, chamado Tudo Azul.

Tanto é assim que além da própria Marisa Monte servir como uma espécie de “cicerone”, ponte entre o espectador e os sambistas, o repertório musical ouvido no filme é quase todo fruto do próprio CD Tudo Azul. Da mesma forma, as “participações especiais” de Zeca Pagodinho e Paulinho da Viola, e até mesmo a presença marcante de Monarco, todas elas são as que exatamente estão contidas no CD.

Isso tudo pode não desmerecer o filme em si, mas conhecer esse fato nos faz repensar sua lógica de produção, o sentido da sua existência. Quase como uma peça promocional de um CD lançado há quase dez anos, O Mistério do Samba acaba sempre ficando refém do seu extraordinário repertório (em especial as canções de Manacéa, como a obra-prima “Nascer e Florescer”). No início, com imagens fixas e uma voz-off que parece querer buscar o olhar “pitoresco” e “posado” com que geralmente o samba é retratado, busca-se uma falsa sofisticação de imagem que no fundo é totalmente vazia. Mas a partir da metade do filme, há uma certa intimidade, valorizando as músicas e as rodas de samba, e então o filme inegavelmente cresce. Como sempre, o público reage melhor aos “causos pitorescos” (a mulher que jogava pedra no marido, o compositor que mandou “as piranhas lavarem a louça”, etc.). Mas por trás desse anedotário raso, há também comentários interessantes (Argemiro e o samba sobre a garrafa e o sentido da solidão, a importância das pastoras, Tia Eunice falando sobre o miudinho, etc).

É preciso fazer ver que o filme possui um certo recorte em relação a como a própria Velha Guarda da Portela é mostrada, com a ausência desde de membros antológicos (por exemplo Candeia) como de pessoas de hoje que dão visibilidade à VGP mas que o projeto optou por não mostrar (por exemplo Cristina Buarque).

O Mistério do Samba mostra o samba in natura.

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