À Deriva

À Deriva
de Heitor Dhalia
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À Deriva é o melhor filme de Heitor Dhalia, embora os leitores desse blog devam desconfiar que isso não represente um grande elogio. De qualquer forma, há um sopro de humanidade nos olhos de Filipa. É certo que o interesse de Dhalia é o flerte com um cinema contemporâneo visual, com uma câmera móvel e uma fotografia saturada que dão ao filme um look típico dos filmes de festival (de forma que À Deriva mal se parece com um filme brasileiro, e sim um filme de nacionalidade genérica, tipo uma co-produção entre a Suíça e Luxemburgo), além de ligeiramente publicitário. Além disso, um olhar um tanto sórdido para a desagregação de uma família, a lavagem de roupa suja com a traição, e como tudo inevitavelmente conduz à destruição (o que parece ser o grande tema dos filmes de Dhalia). Mas aqui, um pouco depois da metade do filme, especialmente quando a narrativa se debruça sobre a adolescente, há uma certa vitalidade. Filipa, representada com uma doçura sórdida, com uma beleza fugidia por Laura Neiva, é uma Lolita desgraçada, que tentar se inserir no mundo mas não consegue amar, espelho do que vê na relação entre seus próprios pais. Filipa tem um prazer um tanto sádico em provocar a dor no outro – o que é a maior das especialidades do cinema de Dhalia: o sadismo. Ainda assim, o filme tem momentos em que sabe observar as contradições desse personagem (são bonitos os momentos entre ela e seu possível namorado), e esse é o primeiro filme em que Dhalia confessa para si mesmo que essa dor surge de sua impossibilidade de amar. Pode parecer pouco mas parece um passo promissor para quiçá Dhalia resolva jogar pro alto suas “poses sensoriais” para se arremessar para fazer um cinema de verdade, mais maduro, ou ainda, para que seus personagens (Filipa, Nina) cresçam de verdade e deixem de ser meros adolescentes emburrados.

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